O que uma pessoa avarenta está perdendo?

Série Vícios e Virtudes

Jul 9, 2024 - 09:03
Jul 9, 2024 - 09:08
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O que uma pessoa avarenta está perdendo?
Imagem: https://br.pinterest.com/


"Fulano é avarento!". Quando ouvimos esse tipo de comentário, geralmente nossa reação é de rejeição à pessoa, afinal, nosso imaginário logo remete a alguém que acumula bens e dinheiro demasiadamente, sem gestos de generosidade ou mesmo deixando de cumprir certas obrigações financeiras.

O avarento vive em função de aumentar os dígitos de sua conta bancária ou do seu patrimônio, sempre com um olhar voltado para si mesmo. Mas qual a melhor definição para Avareza e onde entra a Generosidade, segundo os estudiosos do assunto? Nosso consultor e entrevistado, o Prof. Dr. Pedro Jeferson Miranda, relata:

"A avareza é uma desordem no campo da concupiscência dos olhos", diz Pe. Tanquerey. É um amor desordenado pelos bens terrenos.

Quando esquecemos que nosso fim, enquanto ser humano, não é terreno, caímos facilmente nesse vício da avareza. De modo geral, a avareza é um sinal claro de falta de confiança em Deus. Quem não confia não ama. E quem não ama a Deus acima de tudo, não cumpre nem o primeiro mandamento do decálogo […]".

Isso não quer dizer que a riqueza é algo ruim e repreensível. O professor explica que a riqueza material "deve ser para servir às necessidades do corpo e da alma, de modo a propiciar a conservação da vida, da dignidade e dos meios de cultivo da inteligência".

E ainda: "Tudo que possuímos é fruto da Providência e não da "nossa conquista" individual. Pense nas pessoas que contribuíram para seu desenvolvimento, […] ou como as situações foram exatamente precisas para você obter os bens que tem ou os meios de adquirir esses bens".

Nesse contexto, recorda os "ensinamentos dos antigos santos padres: que o dinheiro que nos sobra é dos pobres". "Devemos sempre retribuir os bens que recebemos, dando a quem não tem nada: devemos pensar mais em obras de misericórdia e de caridade a fim de sermos dignos de tudo que recebemos nesta vida mortal e terrena".

Bens preciosos que não podem ser comprados

Outra definição relevante, nas palavras do nosso entrevistado, é que "a avareza é uma confusão e uma desordem sobre a finalidade e dignidade dos diversos bens". Ao classificar os bens em: bens úteis, bens prazerosos e bens preciosos, ele descreve o dinheiro como um bem útil que, "não tendo finalidade em si mesmo, só tem seu valor na medida que outras coisas existem, como: alimento, abrigo, remédios, livros, condução etc.".

No entanto, mesmo sendo esses itens úteis e necessários, "não suprem o que realmente precisamos: que são os bens preciosos". O professor explica algo que nem sempre nos damos conta e que realmente precisamos lembrar com frequência, na trajetória para uma vida realizada: a necessidade de nos esforçarmos para conquistar o que desejamos.

"As virtudes não podem ser compradas, nem o conhecimento, nem a saúde, nem os dons. Tudo que podemos fazer é colocar-nos em situações que nos dispõe a tê-los. Por exemplo, posso pagar um professor para me educar, mas isso não é garantia que eu aprenda. A aula propicia que eu aprenda e tenha conhecimento, mas não garante. Os bens preciosos não têm uma medida para serem bons, diferente dos bens úteis, como o dinheiro. Se tu tens muito dinheiro, tuas preocupações e obrigações mudaram de escala e grande parte do seu tempo será devotado a cuidar dos bens materiais. O mesmo se dá com os alimentos: posso comer cem porções de carne, pizza, lasanha ou qualquer outro alimento delicioso? Não. Pois então, trata-se de um bem útil e não um bem precioso".

E quanto aos bens preciosos?

"Os bens preciosos, como saúde, conhecimento e virtude, quanto mais tivermos, melhor seremos ou estaremos […]". Aqui entra a Generosidade:

"[…] A generosidade é a virtude correspondência ao bom emprego dos bens materiais. Isso se dá principalmente na administração do dinheiro e do tempo. […] É a capacidade de ser livre na administração dos bens, sem se preocupar excessivamente com o futuro. Essa preocupação excessiva com o futuro pode consumir uma vida, daí o seu mal: não há liberdade na preocupação demasiada nas coisas materiais".

O que há "por trás" de uma pessoa avarenta?

"Se a pessoa é avarenta, isso já é sinal de falta de amor, logo de infelicidade. O acúmulo de bens, seja por medo do futuro, seja pela filargíria - termo grego que corresponde a um amor pelo dinheiro - é fonte de diversos outros vícios como a injustiça, a impiedade e a sensualidade. Muitas portas para coisas ruins são abertas pela avareza. Uma dela é o ócio improdutivo. Alguém excessivamente rico vai usar o seu tempo livre para futilidades. Dou exemplos: novidades inúteis, moda, itens luxuosos, fama etc.. […] Não é à toa que Jesus fala ao jovem rico: 'Se queres ser perfeito, vai, vende os teus bens, dá o dinheiro aos pobres, e terás um tesouro no céu. Depois, vem e segue-me'. […]" - responde nosso entrevistado.

O que uma pessoa avarenta está perdendo?

 “A pessoa avarenta está jogando fora sua liberdade e sua tranquilidade. O avarento está sempre aflito em manter e adquirir mais bens.

Se for alguém que trabalha exclusivamente com o fim de acumular bens, ele vai passar a vida toda trabalhando para, no final, ter que deixar tudo aqui na Terra; podendo ainda ser motivo de brigas entre os familiares por motivos de herança. Realmente, o acúmulo excessivo de bens é contrário à natureza da alma humana, é um vício; e como todo vício, nos escraviza”.

E o que uma pessoa generosa está ganhando?

 “Uma pessoa generosa está mais apta a ver e valorizar os bens preciosos que temos na vida, como as virtudes, a paz e a tranquilidade. A generosidade traz uma alegria interna que é indescritível. Quem é generoso tem uma liberdade muito superior a quem é preso a alguma coisa, lugar ou bem material. Podemos dizer que só há liberdade na generosidade sincera. O generoso ganha uma felicidade sobrenatural”.

Recorremos novamente ao Pe. Tanquerey: “[...] Para melhor despertar o coração, não há meio mais eficaz que depositar os seus bens no banco do céu, consagrando uma parte generosa aos pobres e às obras. Dar aos pobres é emprestar a Deus. [...]” [Em: A Vida Espiritual – Explicada e Comentada / 1961 - Tradução do Padre Dr. João Ferreira Fontes, pág. 472.]

E aí? A partir da leitura desta reportagem e das reflexões que ela provocou em você, qual será seu gesto de generosidade hoje? Compartilhe esta matéria para que mais pessoas façam o mesmo!

Lembramos que a série de reportagens do Jornal e Portal CCO sobre Vícios e Virtudes é resultado de uma parceria com o Prof. Doutor Pedro Miranda, paulistano que mora em Ponta Grossa/Paraná. Ele leciona Filosofia Tomista e é fundador e conselheiro geral da Confraria Tomista, dentre outras áreas de atuação.

A próxima matéria será sobre Caridade (em oposição à Inveja).

Entrevista e Redação: Jornalista Rita Miranda.

Matéria publicada no antigo site do Jornal CCO em setembro de 2022.